segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Antão, Pai dos Monges

        A partir de um certo momento, a fama de Antão saiu do deserto e chegou ao conhecimento dos moradores de povoados e cidades vizinhas; e eram muitos os que iam a ele a fim de pe­dir-lhe conselhos, orações, e até a cura de doentes.  E quando Antão se sentia muito incomodado pelos visitantes que inter­rompiam o seu retiro e a sua solidão voluntária, retirava-se às escondidas, penetrando ainda mais deserto a dentro.
Foi o que aconteceu no ano 285, quando já tinha 35 anos: interrompeu quase totalmente as relações humanas e retirou-se para o leste, em direção ao mar Vermelho, entre as montanhas de Pispir, no deserto da Tebaida.
Foi antes ao encontro daquele ancião que se tornara seu amigo e conselheiro e rogou-lhe que fosse viver com ele no deserto. O outro declinou do convite, sobretudo devido à sua idade. Então ele se foi sozinho para a montanha.
Estabeleceu-se perto de uma fonte, onde havia um velho castelo abandonado, ninho predileto de serpentes e víboras, on­de permaneceu por quase vinte anos.  Durante sua permanência ali não se apresentou a ninguém, nem mesmo a seu fiel amigo, que lhe lançava os alimentos por cima das muralhas, pois havia combinado com ele para, de seis em seis meses, levar-lhe pro­visão para a temporada.  No Egito se fabricava, na época, uma certa qualidade de pão que se conservava até um ano, sem se estragar.
Ali Antão fixou residência. As serpentes e víboras, como que expulsas por alguém, foram-se de repente. Antão bloqueou a entrada e depois de enterrar pão para seis meses - assim o fazem os tebanos, e muitas vezes os pães se mantêm frescos por todo um ano - e ainda tendo água perto, desapareceu como num santuário. Ficou sozinho, não saindo nunca e não vendo ninguém passar. Por muito tempo perseverou nesta prática ascética; só duas vezes por ano recebia pão, que lhe deixavam cair pelo teto.
           Seus amigos vinham uma ou outra vez supondo encontrá-lo morto, mas o ouviam cantar: "Levanta-se Deus e seus inimigos se dispersam; fogem de sua presença os que o odeiam. Como a fumaça, eles se dissipam; como se derrete a cera ante o fogo, assim perecem os ímpios diante de Deus" (Sl 67,2). E ainda: "Todos os povos me rodeavam, em nome do Senhor eu os expulsei" (Sl 117,10).
Nesse período da vida de Antão, difundiu-se ainda mais a fama de suas virtudes, até que, depois de muitos anos de colóquio íntimo com Deus, resolveu apresentar-se aos visitantes e rece­bê-los.  Sempre tranqüilo e alegre, recebia todos os que vinham a ele e, naqueles encontros, Deus, usando Antão como instrumento, curava doentes, consolava aflitos, reconciliava inimigos. Era paciente por disposição e humilde de coração. Sendo homem de tanta fama, mostrava, no entanto, o mais profundo respeito aos ministros da Igreja e exigia que a todo clérigo se desse maior honra do que a ele. Não se envergonhava de inclinar a cabeça diante de bispos e de sacerdotes que o procuravam. Seu rosto tinha grande e indescritível encanto. O Salvador lhe tinha dado, por acréscimo, este dom. Não eram nem sua estatura nem sua figura que o destacavam entre os demais, mas seu caráter sossegado e a pureza de sua alma. Ela era imperturbável e assim sua aparência externa era tranqüila. O gozo de sua alma transparecia na alegria de seu rosto, e pela forma de expressão de seu corpo se sabia e conhecia a estabilidade de sua alma, como o diz a Escritura: "O coração contente alegra o semblante, o coração triste deprime o espírito" (Pr 15,13).
E muitos admiradores, edificados com seu exemplo de vida si­lenciosa e de união com Deus, resolviam também abraçar aquele gênero de vida, em busca da perfeição.  Fugindo das per­seguições do Império Romano e, atraídos pelo exemplo de An­tão, mais de 5.000 homens resolveram levar também uma vida de renúncia e oração, no deserto, e assim a força do exemplo fi­zera com que eles se organizassem em comunidades de mon­ges, tendo Antão como seu orientador espiritual e pai. A partir daquele momento, o deserto começou a ser povoado por monges, que construíam suas cabanas nas proximidades da moradia de Antão, de quem recebiam orientação. Antão, já com mais de 35 anos de idade, abandona a solidão absoluta e se converte em pai e mestre de monges. Em torno dele formam-se pequenas colônias de ascetas.  Por volta do ano 300 é possível encontrar eremitas em todos os lugares, no deserto, muitos deles discípulos de Antão.
Monges, na época, eram eremitas que viviam em cabanas, não muito distantes uma das outras, quase sempre sob a direção e orientação de um deles.  Trabalhavam com as próprias mãos, produzindo seu próprio alimento e rezavam.  Com o passar dos tempos, passaram a vi­ver em comum, em mosteiros, como acontece hoje em dia.
Foi assim que começou a vida monástica, no deserto.  Tendo já terminado o tempo dos mártires, vítimas dos Imperadores Romanos, nascia na Igreja esta nova maneira de testemunhar: a dos monges, que surgiam por toda parte, nos desertos, e posteriormente nas cidades, e procuravam viver de uma maneira radical e fervorosa, os conselhos evangélicos.
Antão jamais fundou mosteiros, nem mesmo organizou a vida dos monges.  Ele, apenas com sua vida e seu exemplo, deixou uma idéia, plantou uma semente, que em breve brotaria e daria frutos.  De fato, o exemplo de vida ascética de Antão difun­diu-se e espalhou-se, cresceu e amadureceu por toda parte, começando pelo Oriente, atingindo também depois o Ocidente.  Foram os seus discípulos e admiradores Pacômio e Hilarião que mais se destacaram na organização e difusão de grupos mo­násticos.
Quando a idéia e exemplo do santo eremita começaram a ser postos em prática, ele ainda vivia; e depois de sua morte, agigantou-se de tal maneira aquela idéia que influenciou muitas e muitas gerações, tornando-se uma luz para os séculos futuros.
Com o passar dos anos, as colônias de eremitas, nas ca­vernas e túmulos do deserto, iam se transformando em mostei­ros e conventos, semelhantes a fortalezas, tão numerosas na Idade Média, algumas das quais continuando ainda hoje de pé, testemunhando. Depois de Antão o mundo viu se multiplicarem os mosteiros e comunidades de homens e mulheres que passa­ram a viver no deserto e nas cidades, a vida de renúncia, de trabalho, de união com Deus, que o santo do deserto ensinara a viver com o seu exemplo.
Tão ligado ficou Antão à vida dos monges, como seu ins­pirador e orientador espiritual, que até hoje ele é chamado e conhecido como  "Pai dos Monges", e até é considerado como o monge mais ilustre da Igreja antiga, no Oriente, o primeiro Abade.

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